Psicologia e Terrorismo: Afinal, do que é feito o terrorismo?

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Quando falamos em terrorismo lembramos de um dos maiores eventos catastróficos do mundo: Nova York, 11 de setembro de 2001.

As Torres Gêmeas se estilhaçando com o choque do avião, pessoas pulando dos edifícios, tudo pegando fogo. Também nos vem a imagem de pessoas encapuzadas, sujeitos com um arsenal de bombas amarrado em seus corpos, prontos para explodir em meio à multidão. Recordamos de jovens armados carregando orgulhosamente bandeiras de seu grupo. Seus produtos no mundo geralmente são os mais destrutivos aos demais crimes contra a humanidade. A aniquilação de vidas por um ideal ou a derrubada de um monumento em território inimigo são exemplos de suas ações. Os noticiários mostram quase que diariamente este fenômeno. Entretanto, pouco se sabe cientificamente a respeito dele enquanto objeto de estudo da Psicologia.

O que se sabe é que a grande maioria das pessoas que se integra em grupos terroristas radicais não possui uma psicopatologia relacionada ou determinante (DeAngelis, 2009). Ou seja, pensar que os grupos terroristas são apenas compostos por sociopatas, serial killers ou pessoas com transtornos impulsivos e violentos é um mito. Não se sabe ao certo a porcentagem de sujeitos associados ao terrorismo que tem alguma condição psicopatológica, isso, muito devido à dificuldade no acesso a estes sujeitos. Mas o que determina que tais pessoas engajem em atividades terroristas?

As variáveis determinantes do comportamento terrorista são complexas e multideterminadas. As matrizes determinantes vão desde motivações pessoais até o desenvolvimento paulatino do indivíduo no grupo terrorista, onde pode aprender mais a respeito do grupo e de suas atividades (Horgan, 2003). Dentre as motivações pessoais e sociais, encontramos: a) Sentir-se com raiva, alienado ou privado de seus próprios direitos; b) Acredita que o envolvimento político vigente não lhes concede poder suficiente para uma real mudança social; c) Identificam-se como vítimas de injustiça social pela qual lutam; d) Sentem que devem tomar alguma decisão ao invés de conversar a respeito do problema; e) Acreditam piamente que qualquer violência contra o Estado não é imoral; f) Possuem amigos e/ou familiares que apoiam a mesma causa; g) Acreditam que ao ingressarem no grupo terrorista terão recompensas psicológicas e sociais como aventura, camaradagem e um alto senso de identidade e pertença; (DeAngelis, 2009).

A partir da exploração das possíveis variáveis determinantes do terrorismo, é possível afirmar, em síntese, que os sujeitos que ingressam em grupos terroristas sentem-se excluídos do sistema em pauta; sentem-se ainda, injustiçados e abusados pelo poder vigente do Estado. Logo, a sensação de impotência perante as decisões do governo e dos acontecimentos contrários ao ideal do povo pode contribuir para cada vez mais aparecer uma possibilidade de retaliação contra o inimigo. Sozinho não se faz guerra. Desse modo, buscam somar suas forças por meio da integração do sujeito em um grupo maior, ao qual aumenta o escopo de atuação e a manifestação do sujeito em grupos, que tem como função não apenas compartilhar ideais ou possíveis ações contra o governo e o Estado. Inserir-se num grupo terrorista é ter a fé de que os problemas políticos e estatais serão resolvidos. Além disso, pelo fato de sermos seres sociais, encontra-se alento quando o sofrimento individual é compartilhado com os demais camaradas do grupo. Essa dinâmica tem como função a diminuição de sofrimento e a consolidação do grupo como um todo. Para além da promessa de resolução de problemas e da diminuição do sofrimento, encontra-se o compartilhamento de informações que são de comum interesse. Então fazer parte de um grupo terrorista não tem necessariamente a ver com “sujeitos com transtornos violentos” ou loucura, tem mais a ver com ter fé na solução dos problemas políticos e estatais, compartilhar o sofrimento e a dor de cada um e encontrar um grupo em que possa compartilhar interesses e ter suporte emocional.

Se analisarmos com cuidado, perceberemos que os terroristas normalmente ingressam nos grupos de maneira semelhante a pessoas que ingressam em movimentos sociais legais. Como em partidos políticos ou em ONGs, as pessoas buscam mudança dos processos governamentais e políticos; buscam validação social por meio de suas ideias, projetos, lutas pessoais e sociais. As pessoas conseguem posições organizacionais dentro do grupo e quanto mais fizerem por ele, mais serão admiradas e bem quistas. As conquistas serão premiadas, o grupo terá destaque e maior escopo de ação. Ou seja, depois do ingresso, provavelmente seria muito difícil sair de qualquer grupo, uma vez que lá estão sendo supridas carências emocionais e sociais. Ainda, no caso específico do terrorismo, desertores serão malvistos para o resto de suas vidas e até condenados à morte. Realmente, uma vez dentro do grupo, seria quase impossível sair. Diante desse paralelo de grupo, quais são as semelhanças e diferenças entre o ingresso de indivíduos em grupos terroristas e não-terroristas? Ambos têm como função básica a sobrevivência da espécie. Isto é, fazer parte de um grupo é algo natural para o Homo Sapiens para que consiga sobreviver diante das pressões da natureza, perpetuar seus genes e para viver com a maior qualidade de vida possível. As exceções entre o ingresso à um grupo terrorista e não-terrorista aparecem em suas orientações teóricas e práticas, as quais correspondem à um nível de seleção diferente da seleção natural. Seu nome: Seleção Cultural (Skinner, 1953/2005).

Cultura e religião são variáveis que não poderiam ficar de fora. Estamos mais acostumados a pensar nessa relação devido aos vários incidentes terroristas veiculados pela mídia nacional e principalmente internacional. Com base nos estudos de The Institute for Economics and Peace (2014) foi gerado o seguinte gráfico:

Este gráfico denota a relação entre o número de incidentes por ano de grupos terroristas orientados ideologicamente por: Religião, Política e o Movimento Nacionalista/Separatista. No lapso temporal entre 2000 e 2013, os grupos terroristas-religiosos foram os que mais cometeram ataques. Isso pode salientar a existência de um fenômeno social-religioso complexo que influencia e determina comportamentos terroristas. Então, além das motivações pessoais (e.g. carências emocionais; validação do indivíduo e de suas ideias no grupo), encontram-se fanáticos religiosos que aliciam pessoas desde cedo a agirem de acordo com um ideal maior, um objetivo maior que a própria vida (e.g. homem-bomba). Esse ideal geralmente vem carregado de unilateralidade racional e fanatismo. Para tais grupos, a verdade é única, só existe um deus possível e um único modo de vida. Àqueles que não cumprirem com os mandamentos por eles ditados serão infiéis, pecadores, maculados; logo, devem se curvar ao ideal do grupo fanático ou morrer. Desta maneira, terroristas cativam e aliciam pessoas para seus grupos por meio de ideais religiosos que certamente já estão enraizados na cultura há milhares de anos. Se para um sujeito fazer a vontade de deus for sua maior crença e norte, então possivelmente estará apto a fazer tudo por ele. Que fique explícito aqui: o problema não é a religião em si. O problema é o uso dos moldes religiosos em prol da autodestruição e da destruição de povos que não compartilham de tal crença.

Agora vamos fazer um exercício de imaginação para entendermos um pouco mais a realidade de um terrorista em potencial: imagine uma criança que nasceu em um contexto em que seus pais, irmãos, tios e amigos comungam do mesmo credo fanático (i.e. raramente uma criança fará oposição inicial ao modelo parental). Todos eles te ensinaram que o modo de viver A é certo, enquanto o modo de viver X, Y ou Z é errado. Adicione conflitos governamentais e religiosos entre culturas e povos num espaço geográfico exíguo. Adicione sofrimento, muito sofrimento. E quando referencio “sofrimento”, desejo que imagine pessoas queridas e próximas morrendo pelas mãos de grupos fanáticos inimigos. Veja as pessoas mais próximas à sua volta julgando que a culpa é do inimigo X, Y, Z (sejam eles o Estado ou outros grupos religiosos). Qual é a mensagem que fica para esta criança? No mínimo, um ódio imenso ao inimigo. Deixe essa criança crescer. Deixe que ela se associe ao grupo terrorista que possui ideais semelhantes aos seus. Por fim, deixe que ela empunhe armas e mate ou morra em nome de sua família, de seu povo e de seu deus. Tudo isso é um ciclo que agora mesmo está acontecendo  e se você imaginou o cenário do Oriente Médio e imediações, você não está enganado. Tanto é que os países mais afetados pelo o terrorismo são, de acordo com The Institute for Economics and Peace (2015):

Atualmente estes países enfrentam crises financeiras, políticas, religiosas, territoriais e culturais. E logo fica a pergunta: Como um estado doente pode gerar cidadãos saudáveis? Não há estabilidade. As pessoas estão fugindo destes países. Refugiados arriscam suas vidas para sair do caos e logo percebem que o terrorismo não é a melhor opção, pois invariavelmente resultará em mais mortes e sofrimento.

Em síntese: não há apenas uma variável que determine um sujeito a fazer parte de uma organização terrorista. Variáveis biológicas, sociais, psicológicas, religiosas, culturais, estatais e políticas estão em jogo. Desde cedo estas variáveis moldam o comportamento do sujeito, ao qual, sem muita opção, encontra alento, compartilhamento de interesses, soluções estatais, validação e camaradagem em grupos terroristas. Provavelmente a falta de um sistema alternativo à cultura atual está minando jovens ao terrorismo e, aqueles que já não suportam mais os conflitos, se refugiam em outros sistemas alternativos.

Para maior entendimento do fenômeno, assista os seguintes documentários:

OBS: algumas cenas podem ser perturbantes.

ISIS’ children: soldiers trained to kill and die

Video 1: (Clique e assista)
Video 2: (Clique e assista)

ISIS Training Video | Incredible Tough Training Given to Child Executioners | Mango News

Video 3: (Clique e assita)

Referências

DeAngelis, T. (2009) Understanding terrorism. Psychologists are amassing more concrete data on the factors that lead some people to terrorism—and using those insights to develop ways to thwart it. Vol.40, No10. Retrieved from: http://www.apa.org/monitor/2009/11/terrorism.aspx.

Horgan, J. (2009) Leaving Terrorism Behind: Individual and Collective disengagement. New York, Routledge.

Skinner, B.F. (2005) Science and Human Behavior, Cambridge, Massachusetts: B.F. Skinner Foundation.

The Institute for Economics and Peace (2014) Global Terrorism Index 2014: Measuring and Understanding the Impact of Terrorism. Oxford, IEP.

The Institute for Economics and Peace (2015) Global Terrorism Index 2014: Measuring and Understanding the Impact of Terrorism. Oxford, IEP.

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Psicólogo Guilherme Barbosa
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