Relacionamentos Abusivos

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Você sabe o que é uma relação abusiva?

Sabe aquele casal que briga com frequência, não consegue sair porque encontram motivos para criar discussões e/ou brigas em qualquer situação? Ou aquele casal que quando sabemos estar presente em um dia especial, já pensamos “iiih, fulano e fulana irão brigar”, ou ainda, aquele casal onde um dos companheiros fala, dança, se diverte e, quando outro faz o mesmo, o primeiro fica bravo/chateado? Então, são pequenas demonstrações de “eu posso, você não” que caracteriza certa superioridade de um e fragilidade do outro.

Essas são algumas pequenas demonstrações do que pode vir a ser uma relação abusiva que, basicamente, é uma maneira viciosa e egoísta de relacionar-se.

Nesta configuração, há coexistência de comportamentos e atitudes conscientes e inconscientes que se manifestam de maneiras ambíguas (muitas vezes), fazendo com que existam vários “nós” no envolvimento afetivo. As relações abusivas ocorrem com frequência e cada vez mais cedo nos dias atuais e as vítimas sentem-se culpadas e incapazes diante das atitudes do cônjuge, optando por viver e conviver de maneira passiva, e até mesmo desagradável, a fim de evitar pequenas confusões e discussões com quem aqui chamamos de ‘agressor’ ou ‘manipulador’, gerando assim, certa dependência entre as partes.

Neste tipo de relacionamento, é perceptível o jogo de controle que um exerce sobre o outro, sendo comuns características como: manipulação, ciúme, críticas, indiferença emocional, abusos verbais, psicológicos, sexuais e, em alguns casos, a própria violência física. De uma maneira geral, os relacionamentos abusivos são caracterizados por atitudes que demonstram poder sobre o outro, com a finalidade de obter vantagens e satisfazer os próprios desejos.

Para discorrer sobre a temática e levá-la adiante, é necessário um olhar amplo e sistêmico, sendo importante a inclusão de dimensões subjetivas e relevâncias sociais, históricas e culturais inerentes, pois muitos dos comportamentos abusivos nas relações estão amparados a padrões de normalidade que variam conforme uma sociedade ou outra, sendo necessário, então, o estudo individual de cada agressor e/ou agredido, a fim de auxiliar da melhor maneira a cada ser envolvido.

Neste sentido, há vários fatores envolvidos, uma vez existentes as fragilidades psicossociais, regras impostas desde o nascimento, diferentes maneiras e referências familiares, modos de aprendizagem que dificultam as pessoas de exercerem seu papel com autenticidade, sendo encorajadas a enquadrarem-se dentro de critérios melhor  visto e aceito pela sociedade.

Quando o parceiro se vê completamente dependente do outro, de forma doentia e obsessiva, é fundamental a compreensão do verdadeiro sentido do comportamento de dependência emocional no relacionamento e isso implica autoconhecimento e consciência da situação, ou seja, para existir mudança é preciso promover fortalecimento de atitudes assertivas e saudáveis, porém, isso depende da reação diante do que o outro está oferecendo. Muitas vezes o que o outro nos oferece não diz respeito ao que merecemos, e sim daquilo que ele é capaz de dar. Somente desta maneira poderá haver amadurecimento da relação, sendo assim, a experiência pessoal subjetiva é a condição especial para reconhecer, aceitar e assumir responsabilidade diante de si e da relação, a fim de transformar e gerar possibilidades e oportunidades positivas ao relacionamento.

É importante ressaltar que a dependência é responsabilidade dos pares, ou seja, do sujeito dependente e do sujeito manipulador, o que sugere uma co-dependência de ações, sendo comum ao par a insegurança em sustentar a relação caso haja qualquer comportamento fora daquilo que já é conhecido (o famoso “medo de perder”), seguido pela dificuldade em enfrentar os conflitos que, geralmente, são baseados na cultura do agradar.

Um dos fatores mais evidentes, nas relações abusivas, está relacionado ao ciúme, no qual há sinal de insegurança, posse, dominação e controle, porém, a intensidade como é manifestado faz diferença. Se expressado com repertório que cogita zelo e cuidado poderá ser bacana, mas expressado com atitudes desequilibradas, de modo excessivo e fora das limitações saudáveis, requer cuidados, pois nesses casos há concretização do adoecimento do relacionamento. É necessário expor, com frequência, as atitudes das quais nos deixam em desconforto na relação.

A chantagem é outro sinal de manipulação emocional, sendo um recurso disfuncional e prejudicial, pois a pessoa que manipula quer que outro satisfaça seus desejos e objetivos, utilizando-se de uma variedade de motivos, dramas e insistências, além de pressão ou ameaça e, ainda, presentes, elogios e promessas. A pessoa manipuladora, por mais que aparente ser firme e segura, na verdade utiliza dessas atitudes pela insegurança e insatisfação, jogando com o outro por não acreditar em si.

Neste sentido, pode-se advertir que, quem se coloca numa posição de superioridade num relacionamento, pode ter adoecimento psíquico, tendo a necessidade constante em auto afirmar-se e sentir-se superior para compensar sua inferioridade interna (aquilo que acredita ser ela mesma). O agressor, seja ele homem ou mulher, tem intuito de desestabilizar e desequilibrar o outro emocionalmente, deixando-o frágil diante das situações.

Em nossa sociedade, há milhares de anos, sustentamos a visão de mundo baseada em valores patriarcais, acreditando que os atributos masculinos são mais fortes e importantes, considerando esse modelo “base” para as ações. Por este motivo, temos a sensação de que as mulheres são vítimas com maior frequência nesse tipo de relacionamento, pois as características e sabedoria do feminino são entendidas como frágeis, sendo nós, mulheres, reprimidas. Através desta visão, surgiu o mito de que as mulheres seriam socialmente inferiores, menos inteligentes, desprovidas de conhecimento. Sua existência passou a ter função de servir ao homem.

O empoderamento feminino é possível, e diferentemente do que muitos pensam, as mulheres não querem competir com os homens, apenas buscam a equidade nas relações e nos demais contextos das quais estão inseridas. A busca deve ser baseada em resgatar suas singularidades, inerentes à sua própria essência feminina e potencial existencial como ser único. É essencial buscar reflexão ou acompanhamento psicoterapêutico para compreender a dinâmica do relacionamento e transformar a maneira de relacionar-se, agressor e vítima, a fim de manter o afeto de maneira saudável e positiva, através do amor.

Somente quando o indivíduo olha para si, compreende e aceita sua singularidade, reconhece ser capaz de enfrentar suas próprias inseguranças, crenças, potencialidades e fragilidades é que terá condição e êxito em compartilhar e vivenciar com o outro. Amar a si é, sem dúvidas, o primeiro passo para amar o outro, verdadeiramente; sem cobranças, desafetos, exageros, apegos e submissões. Somente assim é possível a experiência de formar laços na beleza que é estar junto.

Psicóloga Regimeri Leite de Carvalho

CRP 08/16054

Especialista em Relacionamento Afetivo e Familiar.

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